08 setembro, 2007

A ti, parede minha amiga...

Nunca pensei que atravessaria a rua naquele dia, e pela primeira vez, desejaria desaparecer. Sem ninguém saber onde eu estava, simplesmente desaparecer.
Respirei duas vezes ou três antes de subir o passeio, e foi aí que a dor se instalou. Abraçava-lo com tanta força, e envoltos num beijo ardente, lá estavas tu e ele, alheios ao mundo como se mais nada existisse...apenas tu e ele. Tentei afastar o meu olhar mas a imagem perdurava: tu e ele, um só, um beijo. A cada passo que dava, mais o sangue me aquecia, por me lembrar que aquele poderia ser eu, se ao menos... Lá continuavas tu, alheia a todo este meu sofrimento, beijando-o, acariciando-o, chamando-lhe doces nomes. Nomes que eu desejava com todas as forças do meu ser, que fossem para mim...só para mim.
Dobrei a esquina e deixei de vos ver. Continuei na esperança de me esquecer do que senti, de como me senti. Não tardou nada até as lágrimas acorrerem aos meus olhos, e tal como cascata, escorrendo na minha face. A dor de não te ter não desapareceu, pelo contrário continua muito presente, e cada vez mais me aflige. Talvez por ter sido esquecido, talvez por nunca me sentir amado...mas especialmente por saber que um dia tive a oportunidade de ser chamado "teu", de me chamares a mim esses nomes doces, de seres tu a beijar-me tão intensamente e ficarmos sem fôlego. Mas a realidade instala-se, tão dura quando o frio do Inverno, e obriga-me a ver mais uma vez que falhei.
Mais uma vez, por entre tantos outros erros que cometi, errei crassamente e paguei bem caro por isso. Porque não interessa quanto amei, não interessa quanto desesperei por não te ter, não interessa o que sonhei, não interessa o que chorei. Interessa sim o desespero de uma pobre alma que agora se confessa a esta parede vazia e esquálida a que me encosto para chorar, o desespero de um erro cometido que não sei como reparar.
Passei horas, dias, semanas...e não sei como te resgatar desse poço de felicidade e alegria onde agora tu habitas. Pois aí só quem já provou ser merecedor é que pode entrar. Eu...não. Continuo por estes meus recantos obscuros, buscando um laivo de luz que me indique o caminho a tomar, um rasgo de felicidade que me faça ter vontade de respirar e voltar a respirar. Essa luz não chega, essa felicidade recusa-se a ceder perante mim, e partilhar comigo alguma dessa sua realidade. Parece que a felicidade não gostou de mim, e só para me torturar, dia após dia, se mostra a todos outros, por mais indignos que sejam, simplesmente para mostrar o que eu estou a perder.
Sim, eu errei, eu pequei, e por isso mereço castigo, não haja dúvida nisso. Mas mesmo assim até eu, por mais horrendo e pecaminoso que seja, também eu mereço um pouco dessa alegria. Fico feliz porque sei que estás feliz, mas morro um bocadinho todos os dias, porque sei que não fui capaz de ser eu a dar-te essa alegria. A alegria de viver não é nada mais do que chispas de luz que vão banhando quem as merece, pois a verdadeira alegria vem de quem consegue reflectir essa luz, e torná-la bem maior.
Parede, minha amiga, a ti te contei um pouco do meu sofrimento. Infelizmente, sou um disco partido, que dia após dia continua a gemer e a contorcer-se pelos mesmos pecados cometidos. Agradeço-te por me ouvires e guardares dentro de ti alguma desta dor recolhida.